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Áudios aprofundam crise no governo Bolsonaro

A saída de Gustavo Bebianno do comando da Secretaria-Geral da Presidência não encerrou a tensão no governo, como esperava o presidente Jair Bolsonaro (PSL).

A crise envolvendo Bebianno teve início após uma reportagem do jornal Folha de S. Paulo revelar que o PSL – partido que no ano passado foi presidido por Bebianno, ao mesmo tempo em que ele comandava a campanha de Bolsonaro – usou candidaturas de fachada para desviar verba do fundo eleitoral.

Para tentar arrefecer a tensão e mostrar coesão no governo, Bebianno afirmou ao jornal Globo, que não havia crise e que, somente naquele dia (terça-feira, 12), tinha conversado com o presidente três vezes.

A declaração, publicada no dia 13, foi chamada de “mentira absoluta” pelo filho do presidente, o vereador Carlos Bolsonaro (PSL-RJ), que divulgou no Twitter um áudio de WhatsApp, no qual o presidente supostamente se nega a falar com Bebianno. A postagem foi replicada por Jair Bolsonaro, demonstrando respaldo do presidente à declaração do filho.

No entanto, áudios de WhatsApp divulgados pela revista Veja na última terça-feira, 19, mostram uma versão diferente e apontam que, se alguém mentiu, não foi Gustavo Bebianno, mas sim Jair Bolsonaro e seu filho.

A revista teve acesso a mensagens de texto e áudio, trocadas via WhatsApp, entre Bebianno e o presidente, que mostram que os dois, ao contrário do que disse Carlos, tiveram uma intensa conversa, como havia afirmado Bebianno.

Na terça-feira, 12, Bolsonaro conversou com Bebianno sobre a agenda do ministro, que previa uma reunião com o vice-presidente de Relações Institucionais do Grupo Globo, Paulo Tonet. Bolsonaro critica o encontro.

“Gustavo, o que eu acho desse cara da Globo dentro do Palácio do Planalto: eu não quero ele aí dentro. Qual a mensagem que vai dar para as outras emissoras? Que nós estamos se aproximando da Globo. Então não dá para ter esse tipo de relacionamento. Agora… Inimigo passivo, sim. Agora… Trazer o inimigo para dentro de casa é outra história. Pô, cê tem que ter essa visão, pelo amor de Deus, cara. Fica complicado a gente ter um relacionamento legal dessa forma porque cê tá trazendo o maior cara que me ferrou – antes, durante, agora e após a campanha – para dentro de casa. Me desculpa. Como presidente da República: cancela, não quero esse cara aí dentro, ponto final. Um abraço aí.”

A segunda mensagem é sobre uma nota publicada no site O Antagonista, que fala que Bebianno, a ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, e o ministro do Turismo, Ricardo Salles, viajariam para o Pará para discutir projetos para a Amazônia com líderes locais.

“Gustavo, uma pergunta: “Jair Bolsonaro decidiu enviar para a Amazônia”? Não tô entendendo. Quem tá patrocinando essa ida para a Amazônia? Quem tá sendo o cabeça dessa viagem à Amazônia? Um abraço aí, Gustavo, até mais.”

Em seguida, no terceiro áudio, Bolsonaro indica ter conversado com Damares e Salles, e decide cancelar a viagem, por temor de vir a ser cobrado por obras na região.

“Ô, Bebianno. Essa missão não vai ser realizada. Conversei com o Ricardo Salles. Ele tava chateado que tinha muita coisa para fazer e está entendendo como missão minha. Conversei com a Damares. A mesma coisa. Agora: eu não quero que vocês viajem porque… Vocês criam a expectativa de uma obra. Daí vai ficar o povo todo me cobrando. Isso pode ser feito quando nós acharmos que vai ter recurso, o orçamento é nosso, vai ser aprovado etc. Então essa viagem não se realizará, tá OK? Um abraço aí, Gustavo!”

Em seguida, foram reveladas mensagens trocadas após, o dia 13, quando Carlos chamou Bebianno de mentiroso, sendo apoiado pelo presidente. Nas mensagens, Bebianno – que durante todo o tempo se refere a Bolsonaro como “capitão” – revelam um discussão entre ambos.

Bebianno encaminhou a Bolsonaro uma mensagem de um jornalista – não identificado – que afirma que o filho do presidente está incitando a saída do ministro, o que Bolsonaro nega. O presidente torna a expressar respaldo ao filho e demonstra entender que troca de mensagens não é conversa.

“O caso incitando a saída é mais uma mentira. Você conhece muito bem a imprensa, melhor do que eu. Agora: você não falou comigo nenhuma vez no dia de ontem. Ele esteve comigo 24 horas por dia. Então não está mentindo, nada, nem está perseguindo ninguém.”

Bebianno, em seguida, reafirma ter conversado com o presidente e expressa mágoa em relação ao tratamento recebido.

“Capitão, há várias formas de se falar. Nós trocamos mensagens ontem três vezes ao longo do dia, capitão. Falamos da questão do institucional do Globo. Falamos da questão da viagem. Falamos por escrito, capitão. Qual a relevância disso, capitão? Capitão, as coisas precisam ser analisadas de outra forma. Tira isso do lado pessoal. Ele não pode atacar um ministro dessa forma. Nem a mim nem a ninguém, capitão. Isso está errado. Por que esse ódio? Qual a relevância disso? Vir a público me chamar de mentiroso? Eu só fiz o bem, capitão. Eu só fiz o bem até aqui. Eu só estive do seu lado, o senhor sabe disso. Será que o senhor vai permitir que eu seja agredido dessa forma? Isso não está certo, não, capitão. Desculpe”.

Em seguida, Bebianno lembra ao presidente que sempre esteve ao seu lado e pergunta o que fez de errado.

“Eu só prego a paz, o tempo inteiro. O tempo inteiro eu peço para a gente parar de bater nas pessoas. O tempo inteiro eu tento estabelecer uma boa relação com todo mundo. Minha relação é maravilhosa com todos os generais. O senhor se lembra que, no início, eu não poderia participar das reuniões de quarta-feira, porque os generais teriam restrições contra mim? Eu não entendia que restrições eram aquelas, se eles nem me conheciam. O senhor hoje pergunte para eles qual o conceito que eles têm a meu respeito, sabe, capitão? Eu sou uma pessoa limpa, correta. Infelizmente não sou eu que faço esse rebuliço, que crio essa crise. Eu não falo nada em público. Muito menos agrido ninguém em público, sabe, capitão? Então quando eu recebo esse tipo de coisa, depois de um post desse, é realmente muito desagradável. Inverta. Imagine se eu chamasse alguém de mentiroso em público. Eu não sou mentiroso. Ontem eu falei com o senhor três vezes, sim. Falamos pelo WhatsApp. O que é que tem demais? Não falamos nada demais. A relevância disso… Tanto assunto grave para a gente tratar. Tantos problemas. Eu tento proteger o senhor o tempo inteiro. Por esse tipo de ataque? Por que esse ódio? O que é que eu fiz de errado, meu Deus?”.

Bolsonaro, então, acusa Bebianno de ter plantado uma notícia no site O Antagonista que afirmava que o presidente não estava atendendo Bebianno, o que o ex-ministro nega.

“Ô, Gustavo, usar da… Que usou do Whatsapp para falar três vezes comigo, aí é demais da tua parte, aí é demais, e eu não vou mais responder a você. Outra coisa, eu sei que você manda lá no Antagonista, a nota foi pregada lá. Dias antes, você pregou uma nota que tentou falar comigo e não conseguiu no domingo. Eu sabia qual era a intenção, era exatamente dizer que conversou comigo e que está tudo muito bem, então faz o favor, ou você restabelece a verdade ou não tem conversa a partir daqui pra frente”, diz Bolsonaro.

“Capitão, a nota do Antagonista que o senhor tá me acusando de ter plantado… Se o senhor olhar bem, eu localizei aqui e mandei pro senhor. Eu não plantei nada. Ela replica o que a Folha falou. Está escrito aqui: ‘segundo a Folha, segundo a Folha, o ministro Gustavo Bebianno tentou ligar para Jair Bolsonaro neste domingo para explicar o caso, mas o presidente não atendeu’. Quem mencionou isso não foi o Antagonista, foi a Folha. O Antagonista simplesmente replicou. Então, capitão, eu não plantei nada em lugar nenhum, tá? Abraço”, diz Bebianno.

Em seguida, a conversa mira a polêmica referente às candidaturas laranjas do PSL. “Querer empurrar essa batata quente desse dinheiro lá pra candidata em Pernambuco pro meu colo, aí não vai dar certo. Aí é desonestidade e falta de caráter. Agora, todas as notas pregadas nesse sentido foram nesse sentido exatamente, então a Polícia Federal vai entrar no circuito, já entrou no circuito, pra apurar a verdade. Tudo bem, vamos ver daí… Quem deve paga, tá certo? Eu sei que você é dessa linha minha aí. Um abraço.”, diz Bolsonaro.

Bebianno responde confirmando ter presidido interinamente o partido. No entanto, ele destaca que o repasse de verbas para candidaturas é de competência dos diretórios de cada estado. No caso de Pernambuco – cerne da polêmica onde uma candidatura de fachada recebeu do partido R$ 400 mil – o diretório era comandado pela chapa de Luciano Bivar, presidente e fundador do PSL.

“Em relação a isso, capitão, também acho que a coisa está… Não está clara. A minha tarefa como presidente interino nacional foi cuidar da sua campanha. A prestação de contas que me competia foi aprovada com louvor, é… Agora, cada Estado fez a sua chapa. Em nenhum partido, capitão, a nacional é responsável pelas chapas estaduais. O senhor sabe disso melhor do que eu. E, no nosso caso, quando eu assumi o PSL, houve uma grande dificuldade na escolha dos presidentes de cada Estado, porque nós não sabíamos quem era quem. É… Cada chapa foi montada pela sua estadual. No caso de Pernambuco, pelo Bivar, logicamente. Se o Bivar escolheu candidata laranja, é um problema dele, político. E é um problema legal dela explicar o que ela fez com o dinheiro. Da minha parte, eu só repassei o dinheiro que me foi solicitado por escrito. Eu tenho tudo registrado por escrito. Então é ótimo que a Polícia Federal esteja, é ótimo que investigue, é ótimo que apure, é ótimo que puna os responsáveis. Eu não tenho nada a ver com isso. É… Depois a gente conversa pessoalmente, capitão, tá? Eu tô vendo que o senhor está bem envenenado. Mas tudo bem, a minha consciência está tranquila, o meu papel foi limpo, continua sendo. E tomara que a polícia chegue mesmo à constatação do que foi feito, mas eu não tenho nada a ver com isso. O Luciano Bivar que é responsável lá pela chapa dele. Abraço, capitão”.

Em nota divulgada por sua assessoria, Bivar diz estar “estupefato” com as declarações de Bebianno. “Sobre fala de Bebbiano em áudio, o presidente nacional do PSL, deputado Luciano Bivar, está estupefato e só pode creditar isso ao desespero do ex-ministro. Quanto à saída do Planalto, diz que só Bebbiano sabe os verdadeiros motivos e só ele deve dizer”, diz a nota.

A relação entre Carlos e Bebianno

As trocas de mensagens entre Bolsonaro e Bebianno levantam a suspeita de que Carlos Bolsonaro tenha se aproveitado da crise envolvendo o PSL para derrubar um antigo desafeto, com quem nunca teve uma boa relação.

Vale destacar que, em novembro do ano passado, Carlos deixou de atualizar as redes sociais de seu pai, algo que fazia desde a campanha presidencial. O motivo foi a indicação de Bebianno para a Secretaria de Comunicação Social (Secom) da presidência. A indicação de Bebianno irritou o filho do presidente, que havia sido cogitado pelo pai para o cargo.

Além disso, a ingerência de Carlos no caso foi duramente criticada como uma intromissão do filho, que foi eleito para atuar como vereador pelo Rio, em assuntos do Planalto que não são de sua competência. A deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP), uma das estrelas novatas do PSL, por exemplo, alertou para o cuidado de não se fazer “puxadinho da Presidência da República dentro de casa”.

Outros aliados expressaram espanto e consideraram o caso “um “açoite em praça pública” e uma lição de que o clã Bolsonaro não hesitará em jogar aos leões quem quer que seja para salvar a própria pele, conforme fontes ouvidas pelo Painel Folha.

Candidaturas de fachada e escândalos no governo

Desde o início deste mês, o PSL vem sendo alvo de denúncias de uso de candidaturas laranjas para desviar verba do fundo eleitoral. A primeira veio à tona no dia 4, e envolveu o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio. Na data, uma reportagem do jornal Folha de S. Paulo apontou que o ministro usou quatro candidaturas falsas nas eleições de 2018 para desviar recursos do fundo.

Quatro candidatas apoiadas por Marcelo Álvaro em 2018, quando ele presidia o PSL de Minas Gerais, receberam do partido R$ 279 mil originários do fundo eleitoral – que é irrigado com dinheiro do contribuinte. Do total, R$ 85 mil foram parar em contas de quatro empresas de assessores, parentes ou sócios de assessores de Marcelo Álvaro.

Além disso, o escândalo envolvendo o uso de candidaturas fachada não é o único no governo Bolsonaro. Na mesma semana quem que a crise entre Bolsonaro e Bebianno veio à tona, outro filho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), enfrentou um revés em uma investigação sobre a evolução de seu patrimônio.

A 2ª Câmara Criminal de Revisão do Ministério Público Federal vetou uma tentativa de Sidney Madruga, procurador regional eleitoral do Rio de Janeiro, de encerrar a investigação sobre o caso, sem sequer ter aberto uma diligência. A ação em questão envolve a suspeita de que Flávio superfaturou valores de imóveis em sua declaração de bens à Justiça Eleitoral. Além de vetar a iniciativa de Madruga, a 2ª Câmara Criminal determinou o aprofundamento da investigação.

A ação não tem relação com outro “espinho no pé” de Flávio Bolsonaro: a denúncia envolvendo as movimentações atípicas de Fabrício Queiroz, seu ex-assessor na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Recentemente, Flávio também sofreu um revés nesta ação, após ver frustrada sua tentativa de usar a prerrogativa do foro privilegiado para retirar a investigação das mãos do Ministério Público do Rio de Janeiro e levar o caso para o Supremo Tribunal Federal (STF).

No dia 7 deste mês, ao analisar o pedido, a procuradora-geral Raquel Dodge entendeu que os fatos investigados não têm relação com o exercício do mandato atual de senador, logo não cabe a prerrogativa do foro privilegiado. Dodge, então, devolveu o inquérito para a Procuradoria Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (PRE-RJ).

 VIA: Opinião e Noticia

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