Search
Close this search box.

Americanos criam tecnologia para recuperar fotos nunca reveladas antes para reviver memórias familiares.

Mitch Goldstone e Carl Bergman gerenciam a empresa Scan My Photos, que converte negativos em fotos impressas e digitais.

Embora esta possa parecer uma história triste, ela começa com um menino com poucas lembranças de seu pai, que faleceu quando ele tinha 7 anos. Por isso, Mitch Goldstone valoriza profundamente a única foto que possui com seu pai, tirada na Disneylândia no final dos anos 1960, quando a ideia de as pessoas automaticamente tirarem as câmeras de seus smartphones do bolso só poderia existir na área do parque chamada Tomorrowland (“Terra do Amanhã”).

Contudo, esta história e as histórias pessoais a seguir não são tristes. Mais de cinquenta anos depois, Goldstone tomou uma medida em relação a essa lembrança.

Ele está trilhando um caminho dedicado à alegria da redescoberta. Ele e seu parceiro de longa data, Carl Berman, lideram a empresa ScanMyPhotos, que faz parte de um nicho especializado em transformar bilhões de slides analógicos, negativos não revelados e fotos impressas, capturadas antes da era dos smartphones, em cofres digitais repletos de memórias que haviam sido esquecidas.

“Não há nada igual, há tão poucas empresas produzindo algo que faz as pessoas chorarem quando recebem o produto de volta”, diz Goldstone. “Felizmente, geralmente são lágrimas de alegria.”

Dar uma nova vida digital às fotos analógicas pode trazer à tona lembranças há muito tempo guardadas e proporcionar uma sensação de contemporaneidade. Pode reviver o som das ondas em antigas fotos de férias, trazer de volta de maneira vívida parentes que se foram há muito tempo e reacender o amor incondicional por um animal de estimação da infância. Pode lembrar as complexidades das relações familiares, evocar momentos esquecidos e, talvez a parte mais bonita, facilitar o compartilhamento dessas memórias.

Isso aconteceu comigo. Finalmente, depois de anos de procrastinação, decidi confiar aos profissionais a tarefa de digitalizar os slides Kodachrome que herdei do meu pai de 81 anos quando ele faleceu em 2019.

Eu não tinha conseguido olhar para eles, não de uma perspectiva emocional, mas porque não tinha o equipamento adequado para visualizar slides analógicos. A conversão para formato digital me levou a uma jornada de volta à minha infância e ao passado dos meus pais, avós e bisavós. Isso, por sua vez, está me proporcionando um entendimento mais profundo de como me tornei quem sou.

Esse fenômeno é compartilhado por outras pessoas que também tomaram medidas para preservar fotos analógicas que foram cuidadosamente capturadas décadas antes dos smartphones permitirem que as pessoas tirassem fotos de tudo regularmente.

Não é barato. Porém, se você tiver os 200 a 300 dólares (930 a 1450 reais) necessários para o processo, e conseguir encontrar tempo para vasculhar caixas, gavetas e armários empoeirados, poderá abrir a porta para experiências semelhantes.

Ao longo de sua distinta carreira como ator, Ed Asner ficou famoso por interpretar personagens ranzinzas, porém adoráveis, sendo o mais conhecido deles Lou Grant — o editor-chefe em duas populares séries de TV, “The Mary Tyler Moore Show”, de 1970 a 1977, e um spin-off de mesmo nome, de 1977 a 1982. Asner também deu voz ao rabugento Carl Fredricksen na animação da Pixar de 2009, “Up: Altas Aventuras”, que apresentava uma cena emocionante sobre o poder da fotografia para reviver memórias.

Após o falecimento de Asner em 2021, uma cena semelhante se tornou realidade. Seu filho, Matt, encontrou centenas de negativos não revelados. Ele decidiu digitalizá-los, juntamente com um acervo de fotos impressas.

“Para ser honesto, eu não sabia o que esperar”, diz Matt Asner. “É um tanto impressionante. Você recebe de volta esse tesouro que abre seus olhos para um passado do qual você tem algumas lembranças. Mas há muitas coisas das quais você não se lembra.”

Olhar as fotos de seu pai reacendeu memórias que Matt não sabia que estavam latentes em sua mente. Em um dia, ele estava examinando algumas fotos dele mesmo aos 3 ou 4 anos de idade em uma casa de praia no sul da Califórnia, que seu pai alugava para a família durante o verão. Uma foto em particular desencadeou uma torrente de lembranças.

“Havia uma foto minha segurando um peixe morto, e eu me lembrei de ter encontrado aquele peixe na praia e carregá-lo comigo por quatro dias”, ele recorda. “Minha mãe finalmente o jogou fora enquanto eu estava dormindo, porque ele estava cheirando muito mal. Era uma memória intensa que eu havia esquecido.”

A conversão digital das antigas fotos de Ed Asner também trouxe à tona uma série de outras imagens interessantes, como uma do ator jovem olhando pensativamente para si mesmo no espelho, possivelmente enquanto se preparava para um papel. Matt agora compartilha algumas de suas fotos favoritas do pai em sua conta no Twitter, mas o que ele mais gosta de fazer é enviá-las para familiares, algo facilitado pelo formato digital.

“Algumas dessas fotos não eram vistas há 40, 50 ou até 60 anos”, diz Matt Asner, com admiração. “É como abrir um mundo estranho para todos e nos unir como família. Meu pai e minha mãe eram como o cimento que mantinha a família junta. Agora, essas fotos estão preenchendo um pouco do vazio deixado.”

Após se aposentar em 2021 de uma longa carreira como diplomata dos EUA, trabalhando pelo mundo todo, Lyne Paquette retornou à sua casa em Chapel Hill, Carolina do Norte, e resgatou 12.000 fotos que ela havia tirado com sua câmera analógica durante suas muitas viagens. Depois de meses fazendo uma seleção, Paquette enviou cerca de 3.500 delas para serem digitalizadas.

Quando ela as recebeu de volta, se viu transportada de volta para muitos lugares onde havia estado a trabalho ou lazer — diversos países da América Central e do Sul, Austrália, Alemanha, Bangladesh, Síria e Vietnã. Embora ela adorasse relembrar todos os bons momentos com os amigos que fez, algumas de suas fotos favoritas eram das memórias de seus pais falecidos.

“Isso traz de volta tanta alegria, mas também às vezes tristeza”, diz Paquette, de 67 anos. “Eu percebo agora: tive uma vida muito, muito rica.”

Portfólio de um correspondente de guerra Russell Gordon trabalhou em 20 países como fotógrafo, cobrindo eventos que o levaram a zonas de guerra, como a Bósnia. Assim, ao longo de sua carreira, ele acumulou muitas fotos analógicas, slides e negativos. Ele entregou para digitalização 200 de suas favoritas, incluindo registros únicos, como uma foto de um colega jornalista no Afeganistão, que acabou sendo morto pelo homem que estava entrevistando na foto.

“Eu me senti como uma criança no Natal, aguardando com grande expectativa”, diz Gordon, de 58 anos, ao lembrar da espera pelo processo de digitalização.

Ele não ficou desapontado. As lembranças incorporadas nas fotos são ainda mais preciosas para ele, que sofre de transtorno de estresse pós-traumático devido aos anos cobrindo guerras terríveis. “Agora tenho um pouco de qualidade de vida, mas grande parte da minha vida atual é moldada pela nostalgia”, diz Gordon. “Portanto, isso é um grande presente.”

Essa experiência o convenceu ainda mais de que todas as pessoas com fotos analógicas devem digitalizá-las assim que tiverem a oportunidade.

“A vida acontece e as pessoas morrem”, diz ele, suspirando. “Quando você se vai, a menos que esteja deixando dinheiro, a única coisa que deixará para trás serão algumas fotos.”

Mais Matérias

Pesquisar...