O Supremo Tribunal Federal (STF) está julgando, a partir de sexta-feira (29), um caso com potencial para ajustar as regras do foro por prerrogativa de função, que determina quem pode ser investigado, processado e julgado na Corte.
O caso em questão é um habeas corpus apresentado pela defesa do senador Zequinha Marinho (Podemos-PA) e encaminhado ao plenário pelo relator, o ministro Gilmar Mendes.
O julgamento está programado para ocorrer em sessão virtual entre 29 de março e 8 de abril. Nesse formato, não há debate entre os ministros; eles apresentam seus votos em um sistema eletrônico.
Segundo Gilmar, se o pedido feito na ação for aceito, “tem o potencial de alterar, em parte, a orientação atual sobre o alcance do foro especial”. O ministro acredita que a discussão pode “recalibrar os contornos do foro por prerrogativa de função”.
O cerne da discussão envolve a possibilidade de fixar a competência do Supremo em casos de troca sucessiva de mandatos eletivos, mesmo que um dos cargos não tenha foro específico no STF.
O STF tem competência para processar e julgar, nos crimes comuns, o presidente da República, o vice-presidente, deputados e senadores, ministros e o procurador-geral da República. Além disso, tem competência para julgar crimes comuns e de responsabilidade de integrantes dos tribunais superiores, do Tribunal de Contas da União (TCU), embaixadores e comandantes das Forças Armadas.
A regra atual sobre foro no Supremo foi estabelecida em 2018. Para que um processo seja conduzido no STF, é necessário que o crime tenha sido cometido no exercício do cargo e em razão da função ocupada. Se o agente público perder o mandato, o processo é remetido à primeira instância, com exceção dos casos que já estejam em fase final de tramitação.
Em 2022, o STF decidiu que mantém a competência em situações de “mandato cruzado”, ou seja, quando o congressista investigado ou processado por um crime é eleito para outra Casa Legislativa durante a tramitação do inquérito ou da ação penal.
No habeas corpus em questão, a defesa de Zequinha Marinho solicita que uma ação na qual ele é réu na primeira instância seja transferida para o STF. Argumentam que Marinho ocupou cargos com foro privilegiado de forma contínua e que os fatos pelos quais ele é acusado foram cometidos durante seu mandato de deputado.
Zequinha Marinho foi deputado federal por dois mandatos consecutivos, entre 2007 e 2015, e vice-governador do Pará de 2015 a 2018, antes de assumir como senador. Ele foi denunciado em março de 2015, enquanto era vice-governador, pelo crime de concussão. Os fatos estão relacionados ao seu mandato de deputado, quando, segundo o Ministério Público Federal (MPF), ele teria exigido que funcionários de seu gabinete na Câmara depositassem parte de seus salários nas contas do seu partido, o PSC, sob ameaça de exoneração.
Após o entendimento fixado pelo STF em 2018, o caso foi remetido à primeira instância e, posteriormente, para a Justiça Federal do Distrito Federal.
Gilmar Mendes considera que o pedido do senador “não apenas é relevante, como também pode reconfigurar o alcance” do foro especial. Ele acredita que o envio de habeas corpus ao plenário consolida a ação como um meio de formação de precedente em matéria penal, com a fixação de teses aplicáveis a outros casos e juízos.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestou contra o pedido do senador, argumentando que os fatos narrados na denúncia foram cometidos quando ele exercia o cargo de deputado federal e que houve interrupção no mandato parlamentar antes de assumir o cargo de senador.