A dengue é a epidemia provocada por doença tropical que mais matou pacientes em Minas Gerais nos últimos 10 anos, de acordo com a Sociedade Mineira de Infectologia e os dados da Secretaria de Estado de Saúde (SES) de 2010 a 29 de julho deste ano. Para se ter uma ideia da mortalidade dessa infecção transmitida pelo mosquito Aedes aegypti, o número de óbitos nesse período (723) se compara a cinco jatos Embraer E195-E2, o maior avião de transporte de passageiros produzido no Brasil, com capacidade 146 passageiros por aeronave. A abrangência também impressiona. Só de doentes que lotaram os postos de saúde e hospitais – sem contar quem teve a doença e não procurou atendimento – foram 1.983.347 pacientes, o mesmo que 32 estádios do Mineirão com suas capacidades de 62 mil torcedores esgotadas. Em abril, a secretaria decretou Situação de Emergência em Saúde Pública nos municípios de abrangência das Macrorregiões de Saúde Centro, Noroeste, Norte, Oeste, Triângulo do Norte e Triângulo do Sul do Estado.
O ritmo da atual epidemia de dengue já é o mais mortal e abrangente dos últimos 10 anos, segundo dados da SES. Levando-se em conta os 209 dias de 2019 apurados pela secretaria, mas frisando que os casos tendem a cair entre agosto e novembro, os 460.721 atendidos com a doença representam uma média de 2.204 casos diários. Um volume 56% superior de pacientes frente ao ano de 2016, que até então apresentava a pior epidemia. Contando-se aqueles que sucumbiram ao mal, os 117 mortos neste ano representam 6,25% mais vítimas diárias que os 208 de 2016, com um agravante: ainda há 130 casos de óbitos que estão sob investigação e podem fazer esse número disparar.
Para a Sociedade Mineira de Infectologia, o entendimento é de que a falta de conscientização dos cidadãos na prevenção da formação de ambientes propícios à reprodução do mosquito Aedes aegypti seja o motivo principal dessa situação alarmante, agravado pela insuficiência de campanhas preventivas do poder público. “Tivemos várias epidemias nos últimos 10 anos. E interessante notar que a dengue mata poucas pessoas que adoecem, mas como atinge uma população considerável, essa quantidade de óbitos se torna muito grande”, indica o presidente da sociedade, o infectologista Estevão Urbano Silva. A chave para o enfrentamento dessa moléstia sob o povo mineiro vem do próprio cidadão. “Acho que ainda falta um engajamento maior da população na prevenção. Tomar atitudes para erradicar os criatórios do mosquito transmissor, sobretudo nos grandes centros urbanos, onde o volume de pessoas afetadas por um foco costuma ser maior”, afirma.Entre as medidas para se evitar que o Aedes aegypti consiga procriar e por seus ovos, o principal é eliminar a água parada e limpa acumulada nas residências e áreas públicas. Ações como manter caixas d’água tampadas, recipientes secos, bordas de vasos de plantas com areia, limpar calhas, drenar lajes e manter os sacos de lixo sem acúmulo de água são importantes para impedir a postura dos ovos pelas fêmeas do mosquito, sobretudo na época das chuvas.
Não basta apenas saber o que fazer. Na visão do presidente da sociedade mineira de infectologia, as campanhas feitas pelo poder publico são importantes para manter as pessoas motivadas e ativas nessas ações preventivas. “Se temos um número de casos tão alarmante, é poque as campanhas estão insuficientes. Ainda não se conseguiu sensibilizar a população para se cuidar em grandes capitais e regiões metropolitanas”, destaca.
O médico afirma ser importante, também, aprimorar a vacinação. “A vacina que dispomos ainda tem uma cobertura adequada, não sendo distribuída pelo SUS (Sistema Único de Saúde) por alguns motivos. Não pode ser dada para quem nunca teve dengue, pois essa pessoa pode desenvolver uma forma mais grave da doença caso venha a ser contaminado após a imunização. Assim, fica muito difícil a sua prescrição. Há, ainda, restrições para a faixa etária de idosos”, alerta. Outras estratégias, na visão do especialista, podem ajudar no combate aos focos, como medidas experimentais de soltura de mosquitos que não desenvolvem o vírus causador da dengue para competir com insetos selvagens, reduzindo essa população.
Batalha constante contra o mosquito
As ações de combate e prevenção ao Aedes aegypti são realizadas durante todo o ano nos municípios onde se constata uma epidemia, como na capital mineira. Em Belo Horizonte, segundo a Secretaria Municipal de Saúde (SMSA), o trabalho de prevenção e combate consiste em visitas a imóveis, com o objetivo de informar, prevenir e acabar com focos do mosquito transmissor. “As visitas são feitas pelos cerca de 1,5 mil Agentes de Combate a Endemias. Em 2019, até julho foram realizadas mais de 2,3 milhões de vistorias pelos agentes”, informou a secretaria.
Na capital mineira, o monitoramento é quinzenal, em cerca de 600 pontos estratégicos, com identificação de focos e aplicação de produtos químicos. “São locais, que pela natureza, podem ter objetos ou estruturas que acumulem água, como floriculturas, ferros-velhos e cemitérios. Estes locais são vistoriados a cada 15 dias”, informa a SMSA. Casos suspeitos notificados são georreferenciados e investigados. “Se houver indicação técnica, ocorre a aplicação do produto químico a ultrabaixo volume por intermédio de equipamentos costais motorizados, além da aplicação de larvicidas e adulticidas de poder residual”. Cerca 1,7 mil armadilhas para colocação de ovos (ovitrampas) são instaladas quinzenalmente e recolhidas após sete dias. “O acompanhamento permanente desses resultados auxilia no direcionamento das ações de intensificação, além daquelas de rotina”.
Serviços de atendimento aos pacientes
Para controle do mosquito transmissor, a SES afirma adotar medidas de apoio aos municípios que apresentaram aumento no número de casos de dengue, zika e chikungunya. “A partir do decreto de situação de emergência dessa foi possível mobilizar recursos de forma mais ágil para enfrentamento do Aedes aegypti e estruturação de serviços de atendimento às pessoas infectadas pelo vírus causador da doença”, informou a pasta.
Foi formada uma força-tarefa com agentes da saúde Estadual e da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) para auxiliar a municípios com alta incidência de pessoas com dengue e alta infestação pelo mosquito. “Os agentes de endemias visitarão as residências, comércios, instituições públicas e terrenos vagos para o recolhimento de objetos inservíveis, aplicação de larvicida onde for necessário e, o mais importante, orientar as pessoas, por meio do trabalho de educação em saúde, quais os pontos de atenção para os possíveis focos do Aedes aegypti, mosquito transmissor da dengue, zika vírus e chikungunya”.
Sobre a demora para se confirmar quantas das 130 mortes suspeitas foram ocasionadas por dengue em Minas, a SES informa que “cada óbito notificado pelos municípios passa por várias etapas até ser descartados ou não para dengue. Existe um comitê para discussão e encerramento dos óbitos, em que são avaliados, além dos resultados laboratoriais, a investigação epidemiológica, que pode demandar mais tempo para a conclusão de cada caso”.
VIA: em.com.br | Por Mateus Parreiras